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O longa “Past Lives” e a trajetória dos filmes sul-coreanos no Oscar

Atualizado: 24 de jan.

A marcante vitória de“Parasita” premiação de Hollywood é algo celebrada até hoje, mas quais filmes coreanos quase conseguiram chegar lá?


(Divulgação/A24)

O recente sucesso da coprodução do renomado — e muito bem quisto — estúdio A24 tem chamado a atenção de premiações de renome no circuito de cinema europeu e estadunidense. Past Lives (2023) ou Vidas Passadas, da diretora coreana-canadense Celine Song, trata-se da mais nova aposta sul-coreana para o Oscar 2024, a premiação mais aguardada do mundo do cinema; e o longa foi indicado à premiação para Melhor Filme e Melhor Roteiro Original.


Fazendo jus a popularidade de seus antecessores do mesmo estúdio — Parasita (2020) e Tudo em Todo Lugar Ao mesmo Tempo (2022) — o filme promete ser destaque na premiação após ser indicado ao Globo de Ouro nas categorias de Melhor Filme, Melhor Diretor, Melhor Roteiro, Melhor Filme em Língua Não Inglesa e Melhor Atriz na categoria Filme ou Drama.


A coprodução Minari (2021) do diretor Lee Isaac Chung é o que mais se aproxima da proposta de Vidas Passadas em especial, por se tratar de um longa-metragem oriundo de um diretor coreano-americano, assim como o longa de Celine Song. A resposta positiva do público e da academia ao filme trata-se de uma demonstração do poder do audiovisual sul-coreano e da abertura a narrativas sobre imigração e identidade leste-asiática.



Mas além de Parasita e Past Lives — ou Vidas Passadas —, outras produções — e co-produções — oriundas do país ao sul da península coreana também marcaram de certa forma a história do cinema sul-coreano e sua expansão para o público internacional. Confira a seguir um pouco da história do cinema sul-coreano no Oscar e em outras premiações dos circuitos de cinema europeus e norte-americanos.





Uma longa jornada do cinema coreano


Com uma trajetória cinematográfica que se inicia de forma mais ampla e disseminada a partir de 1945 com o fim do domínio nipônico na região, a Coreia do Sul possui um histórico ferrenho de filmes com duras críticas sociais. Com produções inicialmente focadas na liberdade do país que passou décadas em um regime de repressão que proibia a disseminação da cultura e do idioma. O cinema sul-coreano foi ganhando forma com o passar dos anos até conquistar o investimento necessário em meados dos anos 60 com os primeiros passos para a ascensão econômica do país.


Foi somente em 1962, na 35ª edição do Oscar que uma película sul-coreana chegou a disputar indicação na categoria de Melhor Filme Estrangeiro, introduzida somente em 1957, anteriormente, os filmes em língua estrangeira tinham sido homenageados com um Prêmio Especial.


A película My Mother and Her Guest (1961) do cineasta Shin Sang-ok foi a primeira representante do país na premiação, apesar de não ter sido indicada no final. Apesar de tentar apenas campanhas, mas nunca ser oficialmente indicado ou se quer chegar a pré-lista do Oscar, o diretor chegou a quase representar o país na premiação mais 3 vezes através dos filmes: The Dumb Samyong (1964), Rice (1966) e Mayumi (1990)


Filmes considerados parte da iconografia do cinema sul-coreano tentaram e acabaram não sendo bem sucedidos em suas campanhas em prol de indicações na premiação. Obras como King and the Clown (2006) de Lee Joon-ik, Mother - A Busca Pela Verdade (2009) de Bong Joon-ho e A Taxi Driver (2017) de Jang Hoon foram esnobadas pela premiação, mas não pelo público sul-coreano que constitui uma das maiores audiências do mundo quando se trata de filmes nacionais.


Com uma sequência de tentativas frustradas de receber indicações ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro, a Coreia do Sul obteve sua primeira conquista na premiação com a pré-seleção do longa-metragem Em Chamas (2018) do cineasta Lee Chang-dong e estrelado por Steven Yeun, que apesar do reconhecimento da crítica, não chegou a ser indicado.





A Hallyuwood e o fenômeno de Parasite


O fenômeno da hallyu não se reduz somente ao k-pop e aos k-dramas como forma de disseminação da cultura pop sul-coreana para o exterior. As produções da sétima arte oriundas do país também possuem espaço próprio dentro deste fenômeno global antes mesmo da ampla popularização da música pop. Filmes de ação e suspense sul-coreanos já eram consumidos fora da Ásia desde os anos 2000, sendo Oldboy (2005) de Park Chan-wook um dos maiores precursores em países americanos e europeus.



A chamada “Hallyuwood” é uma forma utilizada para se referir a grande indústria cinematográfica e de entretenimento do país, composta pela junção da palavra Hallyu — que significa "onda" em coreano — com “-wood” — do termo “Hollywood” —, na qual ao lado de Hollywood e Bollywood, a indústria do entretenimento sul-coreana é considerada um dos três pilares da cultura pop na contemporaneidade.


Um dos mais largos passos dados pelo cinema sul-coreano no exterior foi a exibição em larga escala do thriller apocalíptico Invasão Zumbi (2016) — ou Train to Busan — do diretor Yeon Sang-ho e estrelado pelo ídolo Gong Yoo. O filme arrecadou aproximadamente 98,5 milhões de dólares em bilheteria e quebrou recordes de audiência de um filme sul-coreano na Malásia, Hong Kong e Singapura (US$ 3,1 milhões). Somente no próprio país, a arrecadação superou a marca dos 11 milhões de dólares, um belíssimo lembrete de como a Coreia do Sul valoriza o cinema nacional.



Apenas 3 anos depois, o segundo filme sul-coreano a ser exibido de forma global em incontáveis redes de cinema foi o icônico Parasita de Bong Joon-ho considerado por muitos como um dos maiores marcos do cinema asiático ao faturar 262,7 milhões de dólares de bilheteria e ser indicado não somente na categoria de Melhor Filme Estrangeiro do Oscar 2020, como também na categoria de Melhor Filme.


Foi a primeira vez na história da premiação que um filme da Coreia do Sul chegou a ser indicado em qualquer categoria da premiação. O filme disputou seis categorias no total e garantiu quatro estatuetas nas categorias de Melhor Roteiro Original, Melhor Diretor, Melhor Filme Estrangeiro e Melhor Filme, sendo o primeiro não falado em língua inglesa a garantir a categoria principal.



Após o grande sucesso de bilheteria e nas premiações internacionais, foi criada uma grande expectativa acerca das produções cinematográficas do país. O público internacional passou a enxergar um potencial não notado anteriormente na indústria sul-coreana de cinema e, por sua vez, passou a ceder espaço para produções do país. Apesar disso, produções impactantes e aclamadas pela crítica ainda são ignoradas pela premiação, como o recente Decision to Leave (2022) do renomado diretor Park Chan-wook que foi completamente esnobado e se quer saiu da pré-lista.





O cinema de diáspora sul-coreana ganha espaço


Quando pensamos em imigrantes e seus descendentes, é sempre necessário observar como as dinâmicas sociais, culturais e até mesmo familiares acabam tomando rumos diversos, mas muitas vezes carregados de semelhanças. Estar fora de seu lugar de origem é um fator determinante para modificar comportamentos, hábitos e pontos de vista diante das divergências culturais. Contudo, tal fenômeno é percebido de forma ainda mais complexa para os descendentes destes imigrantes.


Analisar a diáspora é pensar em hibridismo cultural e como tal questão é vivenciada por imigrantes e descendentes, que sempre serão vistos como estrangeiros e pessoas “fora do lugar” na maioria dos casos. Tal fator leva populações a se agruparem, criando bairros e comunidades cujo fator em comum são as origens, costumes e normas sociais.


O cinema de diáspora é uma forma de descendentes e/ou imigrantes expressarem seus sentimentos e trajetórias de forma realista — às vezes com um toque de fantasia para ilustrar alegorias — e complexa. Estes filmes não necessariamente possuem uma origem propriamente estabelecida, sendo a ampla maioria parte das chamadas “co-produções”.


O caso de Minari de Lee Isaac Chung e Vidas Passadas de Celine Song é o mesmo, visto que ambos os diretores possuem dupla nacionalidade e expressam através dos filmes as dinâmicas da diáspora sul-coreana nos Estados Unidos.


Contudo, diferente do conteúdo mais realístico de Minari (2021) que acompanha as tentativas de uma família sul-coreana de se estabelecerem em uma fazenda nos EUA, Vidas Passadas utiliza de alegoria principal o conceito de “In-Yun”, que justifica a presença constante de uma pessoa na vida de outra devido a constantes cruzamentos em vidas passadas.


O romance dramático de Celine Song nos leva a acompanha os encontros e desencontros de Nora (Greta Lee) e Hae Sung (Teo Yoo) e o complexo processo de sentir-se distante da própria cultura — logo, de uma parte significativa de si — devido a diáspora. Com um filme em língua coreana, a diretora buscou reconectar-se com as raízes sem necessariamente negar a própria história enquanto coreano-canadense.


A possibilidade de indicação a uma das maiores premiações do cinema no eixo anglo-saxão é uma interessante forma de expressar o poder dos cineastas da diáspora, mesmo que não seja sequer necessário para provar o talento destes diretores, sejam coreanos ou pessoas de dupla nacionalidade. O reconhecimento do homem branco não é nada perto do impacto que filmes como esse e seus antecessores podem provocar para o desenvolvimento do cinema sul-coreano e sua expansão para o resto do mundo.



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